“As reformas que vêm sendo implementadas pelo governo apoiadas na obsessão na redução do 'déficit fiscal', representam uma ruptura radical com os preceitos da Constituição Cidadã de 1988 e inviabilizam a realização de direitos sociais fundamentais como a saúde e a proteção básica aos trabalhadores, aposentados e idosos, mesmo que isso implique na redução expressiva dos gastos sociais.
A visão hegemônica no governo e no parlamento é de que a Saúde, ao invés de investimento, é gasto e que a gestão em moldes empresariais e a redução dos dispêndios são prioridades absolutas, ainda que comprometam a qualidade e universalidade do cuidado à saúde. Daí também decorre a visão largamente disseminada de que o SUS não pode ser universal, pois 'não cabe no orçamento' e deve se destinar a prover cuidados mais simples aos mais pobres. Essa visão equivocada desconhece que as atividades relacionadas ao setor saúde – serviços, medicamentos, vacinas e equipamentos -, respondem por cerca de 8,5% do PIB e incorporam setores estratégicos de inovação - tecnologia de informação, biotecnologia, microeletrônica química fina, nanotecnologia, entre outros – com ampla repercussão em todos os setores da economia, responderam por 10% dos postos formais de trabalho qualificado e empregando em torno de 9,5 milhões de brasileiros em 2015.
A disseminação da imagem de um SUS precário, estruturalmente capturado por trocas político-partidárias, atendendo a interesses privados e insustentável com recursos públicos, apaga da percepção pública os importantes avanços obtidos e fragiliza sua sustentação social. Tal acepção, embora equivocada, se apoia também nos reais empecilhos enfrentados pela população que recorre ao SUS. Apesar do gigantesco esforço de gestores, profissionais, movimentos e entidades comprometidas com o SUS, a experiência cotidiana da população é com frequência negativa em termos de acolhimento, acesso e qualidade.
Isto tem levado a população brasileira a não ver o SUS como um patrimônio da nação e política social a ser preservada e valorizada como bem comum de valor inestimável, como ocorre em outros países com sistemas universais de saúde. Cabe também aos defensores do SUS e aos profissionais de saúde, em particular, a tarefa indeclinável de propor, debater e adotar modelos de gestão e práticas sanitárias que contribuam para a melhoria da qualidade das ações e práticas em saúde. A rejeição liminar a toda e qualquer crítica e a toda e qualquer iniciativa de monitoramento de avaliação de qualidade da atenção à saúde, compromete a base social de sustentação política do SUS.
A justa defesa dos direitos corporativos dos trabalhadores do SUS não está desconectada dos compromissos com a saúde da população. O divórcio entre essas duas dimensões reforça os interesses particulares de elites abrigadas em corporações, sindicatos, setores empresariais, classe média, trabalhadores especializados e de funcionários públicos, que mantiveram seus próprios esquemas assistenciais particulares como serviço suplementar ao SUS. Isto acentua o intenso processo de mercantilização e privatização da assistência expressa no significativo crescimento do setor privado, sustentado em parte por uma política de incentivos e subsídios que subtrai em torno de R$ 25 bilhões anuais do sistema público.”
O texto acima integra o Manifesto em Defesa do SUS – 'SAÚDE E DEMOCRACIA: Desafios para o Brasil Contemporâneo', publicado pelo Fórum pela Democracia em 24/11/17.
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